ASSOCIAÇÃO SOMAR BRASIL

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Juiz de Fora, Minas Gerais, Brazil
A Somar Brasil foi criada em 2010, em Juiz de Fora/MG, quando um grupo de pessoas com deficiência percebeu que, para mudar os discursos da sociedade sobre as dificuldades de inclusão, era preciso derrubar barreiras. Depois de identificadas essas barreiras, colocadas pelas pessoas com deficiência, familiares, empresários, médicos, professores e outros profissionais, o grupo decidiu derrubá-las, uma a uma, num trabalho de campo, em que cada um expõe o que pensa, fala dos problemas e temores e, juntos, buscam soluções. Descobrimos que a palavra “preconceito” perde lugar para “desconhecimento” e por isso é preciso mostrar como conviver em diversidade.

domingo, 14 de agosto de 2011

Somar Brasil entrevista Maurício de Souza


Com um sorriso de história em quadrinhos e uma atenção prá lá de especial. Foi assim que nossa equipe foi recebida por Maurício de Souza na abertura da Exposição História em Quadrões. A mostra, no Museu de Arte Murilo Mendes, trouxe algumas das obras mais famosas do mundo, de artistas como Van Gogh, Renoir, Velasquez e outros, em versões protagonizadas pelos personagens da Turma da Mônica. Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, por exemplo, vira Mônica Lisa que, em uma das telas, foi trabalhada em alto relevo para ser tocada por pessoas com deficiência visual. Também foram disponibilizados catálogos e legendas de quadros e esculturas em braile.

Maurício, que não tem planos de parar de criar, contou que vai lançar uma personagem com Síndrome de Down e que não vê muito avanço na inclusão social.

Somar Brasil - Alguns de seus personagens foram baseados em pessoas de seu convívio. Os personagens com deficiência Luca e Dorinha também foram inspirados em pessoas que o senhor conhece?

Maurício de Souza - Alguns sim. O cadeirante foi baseado nos atletas paraolímpicos, que são ótimos, alegres, extrovertidos, fazem gozação entre eles. Os problemas que eles têm, eles não levam na tragédia, levam na gozação. Eles sugerem saídas criativas, por exemplo, para a acessibilidade, que uma pessoa que não tem esse problema não teria como perceber. E está faltando muita coisa nessa área. A menina cega, a Dorinha, foi baseada na Dorina Nowill (Criadora da Fundação Dorina Nowill para cegos, que morreu em agosto de 2010). Ela era um exemplo de como pessoas com pouca visão ou totalmente cegas tem a possibilidade de viver de novo. Vem ai uma menininha com Síndrome de Down. Ainda estou estudando, há muitos anos estou estudando, porque a Síndrome de Down tem gradações, então você pega um e esquece o outro. Estou com dificuldade de localizar e como vou tratar esse assunto. Tenho estudado até no exterior, como eles tratam a criança com a Síndrome de Down. Uma escola americana tem um sistema que faz com que eles se adiantem nas matérias todas, inclusive algumas que exigem trato físico, em relação às pessoas que não tem Down. Aprendem dois idiomas com 4 anos, fazem bamboletas (brincar com bambolê) com 5, tocam piano. Eu vi isso, fiquei chocado, como é que eles conseguem? Então é possível. Com o estimulo e tratamentos adequados não precisam ficar vegetando, podem viver, participar.

Somar Brasil - Independente da deficiência, seus personagens mostram as possibilidades de uma infância feliz e interativa. A inclusão social é exercida plenamente no mundo da ficção dos quadrinhos. Como o senhor vê o processo de inclusão em nossa sociedade?

Maurício de Souza - Eu não vejo muito avanço, não. Há preconceito. Algo do tipo: “ah, dá muito trabalho, deixa num canto”. É cruel, mas acontece. Então, quando vejo alguém que fala: “ah, meu filho acabou de nascer (com Síndrome de Down)”, eu vou lá e faço discurso, eu me meto um pouco além do que devia. Mas ainda não posso fazer isso no gibi, nas revistas, porque é uma coisa para um grande público e eles vão estranhar um pouco. Posso ter uma posição pessoal, mas a posição do gibi, que atinge milhões de pessoas, tem que ser muito cuidadosa. Então estou tentando situar essa menininha com Síndrome de Down de alguma maneira. Talvez seja mais fácil situá-la na roça, no universo do Chico Bento, porque não tem tanta universalização de eventos e chamamentos, é uma coisa mais simples, então eu estou indo para esse lado. E tem o Humberto, né? Meio mudinho, né? (risos).

Somar Brasil – A gente não sabe se o Humberto é surdo, paralisado cerebral...

Maurício de Souza – É, eu não sei também. Ele está lá, o pessoal (da turma) brinca com ele, de vez em quando gozam dele e fazem um monte de bullyng. Mas ninguém (da turma) sofre bullyng, o pessoal reage. A Mônica também não sofre bullyng, ela reage. Quem sofre é o Cebolinha, com a coelhada (risos).

Somar Brasil – Luca foi apelidado pelos amiguinhos de Paralaminha. Quem é fã do cantor Hebert Vianna e do Grupo Paralamas do Sucesso? O Luca ou o senhor?

Maurício de Souza – Eu (risos). Realmente tem o pessoal do Paralamas, que passou pelo problema, e ele (Hebert) que me explicou muita coisa para eu criar o personagem. Contou a história dele, somos todos amigos. Então eu vou buscando, não é inspiração, é informação para fazer com que o personagem fique o mais possível inteligível, seja aceito como personalidade, como um ser vivo. Está lá, participando do dia a dia.

Somar Brasil – Em 2008, em estilo mangá (história em quadrinhos feitas no estilo japonês), os personagens Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão eram adolescentes e foi um sucesso de vendas. Agora o senhor tem um projeto para lançar a turma na idade adulta. Os personagens com deficiência fazem parte desse projeto?

Maurício de Souza – Está nascendo, está sendo estudada a terceira linha de revista com a turma mais evoluída, para não falar mais velha (risos). Podem voltar melhor resolvidas. Neste caso, a gente pode sugerir locais onde problemas de acessibilidade já foram resolvidos. Tem uma cadeirante americana que praticamente manda no Congresso americano. Ela chega, fala, ela faz uma revolução. Um dia eu falei do nosso estúdio aqui. Ela falou: “tem banheiro assim? Tem acesso a sala? Tem lugar para eu...” Nossa, Não! (risos). Eu não estava preparado, o estúdio não estava preparado. Daí, comecei a preparar, ainda estou ajeitando para receber essa moçada. Como a gente não tem esse problema, a gente esquece. Coisa boba, essencial que faz uma diferença grande para que a pessoa possa se inserir no contexto, possa viver mesmo normalmente, intelectualmente e tudo mais. Quando crio os personagens erros são colocados, alguma coisinha de preconceito que arrasta na educação, que não tinha essa preocupação anteriormente. É difícil brigar com o passado, né? Na área de comunicação já houve bastante evolução. O povão é por quem precisamos brigar um pouco mais.

Somar Brasil - Tem algum projeto na área da educação com os quadrinhos? E isso poderia ser levado para a televisão ou internet?

Maurício de Souza – Poderia. Estamos tentando condições para fazer isso, mas às vezes falta apoio das áreas que poderiam estar ajudando.

E nossa entrevista termina deixando a mensagem da falta de apoio de setores importantes de nossa sociedade que ainda não vêem, não escutam e não andam em direção a integração. Valeu, Maurício! Somos nós, pessoas com deficiência, e seus personagens que devemos mostrar o caminho.

14 comentários:

  1. O trabalho em alto relevo da Mônica Lisa foi feito pela Escola Municipal Cosette de Alencar.

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  2. A deficiencia hj merece um conceito mais abrangente. Passa por um bullyng social ,onde "Todos" que estão fora de um contexto pre definido como "ideal" são rejeitados clara ou veladamente. Assim as deficiencia contextualizadas na teoria, tornam-se mais abrangentes e outras situações de vida como a obesidade e a velhice passam a integrar um conjunto de preconceitos.

    Isto é reflexo de uma sociedade que quer tudo para ontem,onde quem não responde em tempo habil as solicitações do dia a dia,não serve para integrar a sociedade.

    Porem como na fisica,em que toda ação produz uma reação em intensidade igual e contraria,os segmentos que levam estes rotulos,se organizam e buscam seu lugar,seus direitos. Os avanços devem seguir por consolidações de leis,ações e de controle por quem realmente vive e conhece os seus problemas, as suas limitações.É um caminho ,que não considero longo e arduo,mas tão somente o caminho de todas as horas e todos os dias.

    Gostei da entrevista do Mauricio. Que tal seu personagem com sindrome de down apresentar-se cpom a maior das suas caracteristicas que nada mais é do que a honestidade e a sinceridade nas relações.Quando gostam gostam de verdade. O contrario tb é verdade. São colaboradores,grandes construtores de ambientes permeados pelo que é bom na vida. Nada de maldade.
    Parabens Thais pela coragem de seguir o seu caminho despojada,alegre e confiante.

    abs

    Antonio Aguiar

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  3. fiquei emocionada com a entrevista, pois sempre incentivei meus filhos a le-las, ate para servir de exemplo com os personagens.... ja mandei muitas vezes para meu neto que mora no exterior, pois eram as revistas que mais gostava de ler, quando vinha no brasil, e hoje ,ja com 17 anos, ainda pergunta se tenho algumas daquelas em casa, e pede para colocar por sedex.... parabens a somar brasil, pela entrevista e nos proporcionar as boas lembranças dos personagens.... e vamos aguardar a nova da menininha com down...boa sorte.... e bjs nossos...

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  4. O caminho é árduo, mas a conquista é certa, pois não há retrocesso. Todo direito conquistado deve ser exercido e para isso, além da evocação diária de quem necessita, é preciso um órgão público forte,criado a partir da boa vontade de políticos que querem fazer acontecer e não apenas falar o que é preciso fazer. A acessibilidade é o início do caminho para a mudança. Não se concebe mais,por exemplo, um banheiro ou estacionamento para uso público sem acessibilidade, e até outro dia isso não existia... me orgulho de ver pessoas em cadeira de rodas passeando no shopping de nossa cidade. E assim vamos caminhando,mas,e na educação? Quantas barreiras ainda a transpor... No trabalho, quanta luta para externar a eficiência e vencer o preconceito? Na cultura, quem disse que deficiente não pode ser o artista que se apresenta no palco? Mas o camarim não tem acessibilidade... É preciso mudar, é necessário levar para as escolas o Direito. É de pequeno que aprendemos e assimilamos tudo e a conviver com todos. O Direito tem que estar diuturnamente na vida de todos,porque o que fazemos repetidamente se torna parte do todo e então se automatiza. Parabéns, Thais! Devemos fazer o que gostamos e ser bons naquilo que fazemos. Grande abraço!!! Silvana Nazareth

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  5. Thama..se voce tiver a oportunidade de falar com Maurício de Souza, diga para que ele não contextualize a criança com Síndrome de Down com o Chico Bento...Vai entrar no paradigma do "caipira"....Que ele procure contextualizar no esporte, mais específicamente na natação, onde as pessoas com esta síndrome conseguem ótimos resultados.Que ele procure o PROJETO DOWN / CENTRO DE INFORMAÇÃO E PESQUISA DA SÍNDROME DE DOWN, Av. Brigadeiro Faria Lima, 1698 - 4º andar - CEP 01452 - São Paulo - SP...consegui ótimos subsídios lá, em 1991....Quando digo que acaba por se encaixar no "caipira", digo na exclusão...e não é esta nossa intenção...Lutamos por uma sociedade inclusiva....Me coloco à disposição sua e do Maurício de Souza para ajudar no que for possível...Beijos e sucesso..

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  6. Compartilhei no Face e em meu orkut.....

    meu orkut e face : mariaprofetiza@yahoo.com.br

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  7. Muito pertinente e e bem feita a entrevista Thais!!! Parabens!!

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  8. Parabéns Thais pela entrevista.Adoro a Turma da Mônica.Realmente a inclusão não existe, ainda!Mas estamos começando a construi-la através de ações que proporcione o conhecimento,mostrando um novo conceito sobre a pessoa com deficiência. A Somar tem feito esse trabalho com muita sabedoria.
    Parabéns presidenta! tenho um orgulho enorme de você pela sua iniciativa, inteligência e vontade de fazer um mundo muito melhor. Agradeço por conhecê-la e por aprender a ser e querer um mundo melhor contigo.
    Ah! me coloco a disposição para entrar na turma mais evoluída, para não falar mais velha.

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  9. Thais, Parabéns pela entrevista!!! É muito importante quando vemos as questões relacionadas às pessoas com deficiência ganharem espaço em "mares nunca antes navegados"...
    Gostei muito dos temas tratados e considero merecer cuidado o situar da personagem com Síndrome de Down. Com tudo que ele observou de possibilidades dessas pessoas, vale a pena explorar o potencial e ser um espaço para dar mais leveza nas relações.
    Um grande abraço, a SOMAR BRASIL tem trazido excelentes contribuições para a causa da Inclusão. Lenir de Almeida Quetz

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  10. Parabéns Thais! Ele realmente é uma referência e vc também! Abraços.

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  11. Parabéns Thais!!! Muito boa a entrevista, pois o Maurício de Sousa ao criar certos personagens ele está exercitando a cidadania e o respeito pelo próximo . Ele sabe que pode educar por meio de suas histórias em quadrinhos e com os novos personagens ele inclui a inclusão e diversidade. Nós temos que dar nossa contribuição para expandir nossa visão e começaremos a aumentar nossa capacidade de entendimento do que de fato é a inclusão. As leis devem ser devidamente cumpridas e os investimentos aplicados com equidade, justiça, eficiência. Só assim conseguiremos um mundo melhor, onde todos possam viver com dignidade respeitando se as diferenças. Abraços, Adriane.

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